Construindo meu mundo

Hoje pequei o Lego e fui construindo meu mundo…

As mais variadas ideologias disponíveis no Shopping center “Ventos de Doutrina” me permitiam usar regras sociais de acordo com o meu gosto e, melhor ainda, criá-las selecionando aquilo que me convinha de cada uma delas… Consumismo, Hedonismo, Individualismo, Liberdade, ou melhor, Libertinagem me parecia mais excitante.

Construí as casas grandes, pequenos palácios, e as peças que iam sobrando, eu as deixava de lado pra ver se dariam para serem usadas depois. Passei horas edificando aquele meu ambiente, transformando sonhos em objetos concretos e me divertia vendo que a minha criatividade queria sempre oferecer novas idéias. Quando acabava de criar um objeto, logo vinha uma idéia mais interessante…

Depois de ter criados parques, museus, bares, casas, clubes, carros, daquela que chamei Perfeitolândia, peguei aqueles resquícios de peças e, afastado da cidade, criei uma cidadezinha para os bonequinhos sem alguma parte do corpo… cabelo, braço, mão, perna….a minha favela.

Quando a cidade estava pronta, pensei no tipo de habitante que eu gostaria que habitasse nela. Tinha diversos bonequinhos, mas queria que estivessem lá os melhores, os escolhidos, universitários, inteligentes, leitores da Folha, para estarem em sintonia com a minha obra prima.

Apoiei-me na ideologia comprada no “Ventos de Doutrina”, o Individualismo, para selecionar os bonequinhos para a Perfeitolândia. Queria que as pessoas fossem felizes independentemente de qualquer coisa… que buscassem por si só sucesso, fama e é claro, Felicidade. Elas estavam desvinculadas.

Fiquei horas imaginando, como o Vendedor de Histórias de Gaarder, como essas pessoas se relacionariam… Cada uma na sua, construindo as suas verdades, edificando seus conhecimentos a partir do zero. Porém, fui percebendo que, quando se comportavam assim, isoladas, elas cometiam erros bobos, primários. A procura de respostas individuais às coisas que atingem o ser humano intrinsecamente parecia uma corrida de bate-bate infinita. Quando se conseguia andar um pouco, logo as pessoas se chocavam entre si, gerando conflitos intermitentes e infinitos.

Foi aí que entendi o significado das raízes, das tradições, das primeiras gerações. Das regras calcadas em experiências milenares e não simplesmente em vontades do século XX. Nesse momento tive conhecimento de que, olhar para trás, escutar os avós, nos permite fazer mais experiências positivas, tropeçar em novos e não nos mesmos obstáculos e assim, contribuir efetivamente para que a Perfeitolândia fosse realmente uma Cidade Maravilhosa. Porque busca emancipar-se e não simplesmente SER de modo estático, perfeito, como as peças do Lego (e as pessoas do nosso mundo).