Jogaram a Família pelo sexto andar

isabellaNaquele dia 29 de março culminou mais uma das grandes estratégias do mundo pós moderno, para emancipar o poderio capitalista sobre as pessoas que, quanto mais estão sozinhas, mais podem ser dominadas.

Das instituições detentoras da Verdade, em que o bem comum ainda parecia visível, a família era a única remanescente, ainda mais a burguesa, que foi atacada outrora quando o menino João Hélio foi arrastado pelas ruas cariocas ainda sem dengue.

Porém, o que se vê na mídia é uma transformação da vida real em “reality show”, onde se colocam no “paredão” o pai, a mãe, a madrasta, o pedreiro ou qualquer outra personagem passível de ibope.

Nas mesas de bar, nas rodinhas da faculdade, no trabalho, especulam-se culpados sem qualquer pudor, da mesma forma que se discutiam as eliminações do reality show televisivo.

Mas os dias foram passando e o desenrolar da história foi levando à mesma insatisfação que o Big Brother gerou em seus espectadores. A demora para definição de uma resposta final, de um desfeche para esse “romance real” perturbou a sociedade.

Quem foi que matou a linda menininha de cinco anos? Enquanto as autoridades procuram desvendar esse mistério, toda a sociedade esquece de que uma família já foi destruída, arremessada junto com Isabella daquele sexto andar.

Mas, pensando bem, o que parece mesmo é que por trás dessa terrível tragédia, a desmoralização da família, último baluarte social, foi empurrada com uma certa dose de oportunismo do tal selvagem capitalismo. Meus pêsames a nós.

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Os Trolhas (inspirado em Bandeira)

6 Comments

  1. Daniel Fassa

    Oi, Vart!!!

    Seu texto traz reflexões interessantes. De fato, a solidão das pessoas e o enfraquecimento das famílias pode favorecer o consumismo e, consequentemente, o sistema capitalista.

    No entanto, dizer que há uma “estratégia”, um “oportunismo” do sistema, como se o capitalismo fosse um Ser que estivesse ali, entocaiado, esfregando as mãos a espera do melhor momento para dar o bote, é ir longe demais.

    Realmente, a imprensa pode estar sendo truculenta, repetitiva e sensacionalista (cabendo a ressalva de que a cobertura varia de veículo para veículo, devemos tomar cuidado com generalizações).

    Também concordo que isso é reflexo de que o jornalismo insere-se numa economia de mercado e, por isso, a informação também transformou-se em mercadoria. Porém, a idéia de que há uma estratégia de enfraquecimento de determinados valores por trás desse fenômeno soa para mim como uma teoria da conspiração infundada.

    Crimes como esse e o tratamento a ele dispensado pela mídia e pela sociedade são a conseqüencia de uma inversão de valores, não a causa. A causa primeira de tudo isso pode até ser uma cultura capitalista, mas ela tem se consolidado ao longo de alguns séculos de história, nem sempre de maneira premeditada.

    abração, Vart!

  2. Daniel!! Fiquei muito contente com o que vc escreveu! Mais ainda por ter “caído” nessa minha singela provocação à respeito do já cansativo “caso Isabella”
    Entendi as suas discordâncias, principalmente porque a minha “humanização” do capitalismo pareceu sim exagerada, mas acredito estar longe de ser algo impensado. Transformando o capitalismo em ser, quero mostrar que a cultura é fruto de uma construção social, o capitalismo não é só uma idéia, para muitos é um modo de ver o mundo, as pessoas… transformando em produto até mesmo as relações sociais, as instituições e etc…
    Talvez você está sendo um pouco inocente adjetivando com um simples “truculenta” a baixa e desprezível cobertura da mídia por esse “des-serviço” social.
    Nesse caso específico, acredito que dá sim pra generalizar, porque o que conta, o que chega aos cidadãos é a cobertura da Grande Mídia. Sei que muito meios podem fazer coberturas mais apuradas e profundas, mas elas não chegam ao grande público.
    O que você considera Teoria da Conspiração infundada é possível perceber em Durckeimer, Marx, mesmo Lukacs… pois como eles, eu também acredito que existe sim um interesse em dissolver valores rígidos, uniformes, para fragilizar o indivíduo.
    O que causa a inversão de valores??? Ela é natural?
    Acho positivo ser idealista, mas com os pés no chão.

  3. Valter, se você não avisou o Daniel que respondeu o comentário dele, ele não leu.

    O capitalismo é moral?

    Gostaria que vocês lessem esse post sobre o tema http://www.interney.net/blogs/inagaki/2008/04/07/o_mundo_nao_e_para_inocentes/ é de um dos meus blogueiros preferidos!

    Abraços!

  4. Daniel Fassa

    Vart,

    O principal ponto da minha divergência em relação ao seu texto diz respeito à existência de uma “estratégia”, uma premeditação. Mas nisso eu já estou sendo repetitivo. A inversão de valores está longe de ser natural e, em grande parte, tem a ver com a cultura capitalista. Essa cultura, como eu disse tem se estabelecido através de séculos e a mídia tem sido, de fato, um de seus principais veículos.

    Agora, analisemos essa situação específica. O que torna a cobertura da mídia tão “desprezível”? O que a caracteriza como um “des-serviço”? O fato de estar dando tanto destaque ao assunto, com cobertura todos os dias, 24 horas? Ou o simples fato de simplesmente estar noticiando o acontecimento? Ou, ainda, o COMO está noticiando? Faço essas questões a título de esclarecimento mesmo, pra saber o que especificamente te incomoda na cobertura.

    Particularmente, me incomoda saber que um crime como esse ocorreu. Incomoda-me saber que coisas até piores acontecem todos os dias. Seria melhor se eu não soubesse? A mídia deveria omitir essas situações? Assim como você, acredito que a comunicação deva ser colocada a serviço do bem, buscando sempre ressaltar o positivo. Porém, dar a conhecer também aquilo que não é bom, a imprensa pode dar seu contributo, tirando as pessoas da alienação, incomodando-as, criando nelas a vontade de mudar o que está errado.

    Nesse processo, a “grande mídia” a que você se referiu e que eu teimo em não aceitar como um ente único (tb dentro da “grande mídia há diferenças gritantes) geralmente peca pelo excesso. Esse é o principal problema: informação em excesso anestesia, desinforma.

  5. Obrigado novamente pela resposta… vou direto ao ponto, pra não me perder em análises pouco objetivas…
    Considero DESPREZIVEL a cobertura da mídia, que fez um DES-SERVIÇO para a sociedade, noticiando o “Caso Isabella”, simplesmente porque, na grande maioria deles (para não provocar as tais generalizações que você mencionou, mesmo tendo acompanhado praticamente todos os jornais e telejornais de maior audiência) houve um incessante REPRODUÇÃO DO SENSO COMUM… do fato em si, de maneira aparentemente objetiva (pois afinal o que foi dito são somente os fatos) mas que geraram só um mal estar social, um pré-julgamento SEM PROVAS concretas sobre o casal (que nunca mais poderá viver em paz), em vez de provocar um debate que vai além dos fatos.
    Sim… a mídia deve dizer os fatos… da forma mais pura possível, mas…. o deve fazer de uma maneira ética, preservando o ser humano e não usando de uma “falsa objetividade noticiosa” para apontar culpados e destruir assim, vidas inocentes (pois enquanto não houver provas concretas, eles são SIM inocentes).

    Agora… claro que a mídia não deve omitir, mas deve ao menos procurar ser IMPARCIAL… ouvindo os dois lados e gerar uma discussão além do SENSO COMUM, senão será só a reprodução pela reprodução e o tal contributo (que pra mim soa como uma utopia ingênua, mas que deve ser no campo das ações éticas e do amor) nunca será alcançado.

    Que contributo a mídia deu nesse caso, destruindo a vida de uma família? Apontado culpados e fazendo com que o casal tenha que se esconder pra não ser linchado???

    Antes dos fatos… O HOMEM!! Essa é a minha conclusão!

  6. Daniel Fassa

    Então, cara,

    Eu acho que a mídia tem procurado acompanhar as investigações, sem apontar culpados. Você não acha que, qd um telejornal publica as íntegras das cartas do pai e da madrasta da isabela alegando sua inocência, ele não está tentando ser imparcial?Diferentemente de você, eu não acompanhei TODOS os veículos, mas nos que eu acompanhei, vi, sim, um enfoque exagerado sobre o fato, mas vi também essa busca pela objetividade e pela imparcialidade.

    Talvez, a prisão preventiva do casal tenha sido desastrosa, o que nos faz pensar na atuação da justiça, questioná-la. Talvez, a polícia não devesse divulgar tão abertamente o andamento das investigações, como o fez.

    Agora, pensando na frase com que você encerrou sua última resposta – antes dos fatos, o homem – e lendo os posts que o Vitor indicou, percebi que, talvez, fatos como esse nem devessem ser noticiados então. Em que eles contribuem para mudanças sociais? O contributo que eles dão vale o prejuízo causado às pessoas envolvidas? Essas são questões em aberto pra mim.

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