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O silêncio que une: lições de uma despedida papal

O que faz a morte aproximar as pessoas? Que verdades ocultas emergem nos momentos de luto coletivo? Há vinte anos, em outra despedida papal, descobri respostas que transformaram minha compreensão de fé e comunidade.

Em 2005, eu morava em Grotaferrata, nos Castelos Romanos. Em pé na Praça de São Pedro enquanto o Papa João Paulo II estava morrendo (foto acima), senti algo que não conseguia explicar. Havia tristeza, sim, mas também uma estranha sensação espiritual. Como a morte pode aproximar as pessoas? Como perder alguém pode nos ajudar a encontrar o que realmente importa? Olhei ao redor para pessoas de diferentes países e diferentes formas de crer, todas unidas naquele momento.

Naquela noite, eu estava com jovens do Movimento dos Focolares. Rezamos juntos. Então aconteceu algo incrível. O silêncio não era vazio – estava cheio de significado. Pela primeira vez na minha vida, consegui ouvir minha voz interior em alto e bom som.

Descobri que a Igreja não é apenas sobre fazer coisas – é sobre estar junto. É sobre escolher o amor como nosso desejo, nossa escolha e nosso objetivo. A unidade que senti naquela noite não veio de regras ou rituais. Veio de nossa humanidade compartilhada e conexão com Deus.

Hoje, ao nos despedirmos do Papa Francisco – um papa que demonstrou amor maternal e compaixão – entendo melhor por que aquela primeira transição papal que vivenciei me transformou. Cada papa trouxe algo especial: João Paulo II se conectou com o mundo (e me fez conhecer a Flavia 😍), Bento XVI compartilhou profunda sabedoria, e Francisco amou os pobres e marginalizados. Mas todos ensinaram uma verdade: a Igreja vive em corações unidos pelo amor.

Enquanto o mundo para por algumas horas para lembrar do Papa Francisco, recordo que o silêncio ainda ensina mais que palavras. Em nosso mundo barulhento, talvez nosso melhor presente seja aprender a ouvir – uns aos outros, a nós mesmos e à voz silenciosa de Deus que nos conecta a todos.

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O milagre de Francisco

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Hoje de manhã, logo que me levantei, olhando a sacada do apartamento onde vivo, avistei o vaso (excedente) em que estava a flor que eu minha esposa presenteamos os padrinhos no dia do nosso casamento. Logo depois que a flor do vaso morreu, nasceu um pequeno broto, que agora já é uma nova planta.

Observando, rapidamente, aquele pequeno vaso, eu me maravilhei com a dinâmica da vida. Basta uma sementinha, um pouco de água e luz, e tudo renasce, recomeça.

Aqueles segundos de contemplação são difíceis de explicar, mas exprimem a felicidade diante da beleza da relação cooperativa entre a vida e a morte, sentimento que se aproxima bastante da euforia após o Annuntio vobis gaudium Magnum (Anuncio-vos uma grande alegria) de que um novo papa havia sido escolhido.

A escolha de Francisco coloca a Igreja católica em um novo contexto e renova as esperanças de uma mudança necessária na comunidade eclesial.

Enquanto, infelizmente, o mundo laico fala somente em permissão de casamento entre pessoas do mesmo sexo, fim do celibato e o diaconato de mulheres (e no dia de hoje, as dificuldades com o governo argentino e acusações de o antigo cardeal ter violado os direitos humanos, durante a ditadura), o que emergiu, de maneira mais evidente e simbólica, é a “conversão” para um caminho de humildade e simplicidade.

O Clero (ao menos uma boa parte dele), repleto de vaidades, intrigas pelo poder, corrupção e outros tantos problemas, se vê agora “convidado” a retomar sua dimensão original de serviço, pobreza e humildade. O simbolismo da escolha do nome Francisco pelo então cardeal argentino Jorge Bergoglio, remete-se, de maneira bonita, ao seu xará de Assis, que há mais de 800 anos, foi chamado a renovar a igreja dos “poderosos”.

A escolha de um papa “não europeu”, ou melhor, latino-americano, opera uma revolução difícil de mensurar. Em toda a história da Igreja Católica, nunca um representante de outro continente ocupou o posto mais alto da instituição mais antiga do mundo.

O momento histórico, como todos sabem, é difícil. As chagas da pedofilia, a corrupção e intrigas pelo poder, feriram fortemente a imagem da Igreja. Contudo, pelo que se viu ontem, parece que tudo concorre para uma grande mudança.

O contexto é propício, a vontade é grande, só faltava um líder preparado para realizar o renovamento da vida da Igreja, neste “ambiente” em que ela está inserida.

O milagre de Francisco é a sua vida, é ser a semente, pequena, simples, mas perfeitamente pronta para fazer renascer a vida, o amor, que foram propostas por seu fundador, Jesus Cristo.

O testemunho de um papa progressista

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Bento XVI renunciou!

Obviamente isso não é um furo jornalístico, pois a atitude de Joseph Ratzinger estampou centenas de capas de jornais e revistas de todo o mundo.

A repercussão que essa surpreendente decisão gerou na comunidade internacional evidencia o quanto o Papa é uma figura importante no cenário mundial. Nem mesmo a eleição de Obama, considerado o homem mais poderoso do mundo, teve tanto destaque como a renúncia de Bento XVI.

Hoje, passado o susto coletivo, começam as inúmeras especulações do mundo leigo, equilibrada pelas declarações de representantes religiosos, que polarizam as duas perspectivas em torno do acontecimento.

Para o mundo religioso, veio em evidência o positivo. A humildade de Bento XVI foi vista como um ato revolucionário importante, fundamental, em uma Igreja, em certo aspecto, ainda pré-conciliar, e que ainda precisa de uma profunda humanização.

Não sou fã das posições de Arnaldo Jabor mas, na coluna da CBN, ele foi extremamente brilhante ao evidenciar essa importante humanização emersa com a renúncia do Papa. A fraqueza de um senhor, idoso, cansado, deve sim ser considerada, “pelo bem da igreja”.

O “passo” dado por Ratzinger abre precedentes importantes e é autoexplicativa. Dentro do mundo religioso existem seres humanos e não deuses, que devem ser respeitados em seus limites, psicológicos e físicos. Além disso, essa é uma bonita lição para bispos e cardeais que talvez confundam a graça do serviço que são chamados a prestar, com uma (impossível) divinização da pessoa religiosa.

Por outro lado, enquanto o nome de um “novo sucessor de Pedro” começa a ser especulado entre fiéis e curiosos, em palpites dignos de uma conversa de boteco, o universo leigo confabula os porquês da renúncia.

Fala-se abertamente dos jogos de poder dentro do Vaticano. Esta instituição milenar, desculpem os puristas, também é formada por homens, pecadores , como aqueles que fazem parte de governos, empresas, Ongs.

Por isso, se já nas muitas paróquias, congregações, movimentos existem jogos de poder, imagina no Vaticano? Sim, somos homens, pecadores, todos. A diferença, demonstrada historicamente, é que a Igreja, instituição, superou o tempo, as mudanças, intrigas e jogos de poder porque inspirada em algo que vai além dos limites e vaidades dos seres humanos.

O mundo leigo (e também muitos fiéis) exigem mudanças, revoluções, transformações, que respondam com urgências as demandas atuais da sociedade. Porém a Igreja não caminha dessa forma. Ela é conservadora, no sentido bom da palavra, pois busca preservar as doutrinas e ensinamentos fundados na sua origem. Cabe ao Magistério entender os sinais dos tempos e, aos poucos, se desenvolver, mas sem perder sua identidade.

Para mim o positivo é perceber o quanto o Papa é iluminado por algo “maior”. A renúncia de Bento XVI foi uma das reformas mais importantes de seu pontificado e mostra o quanto a Igreja precisa se purificar e superar a “hipocrisia religiosa” para reavivar uma mensagem, universal, que seja resposta para toda a humanidade. 

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