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Voto: direito fundamental ou habilitação?

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Ontem, durante o jantar, tive uma ideia um tanto quanto original a respeito de como podemos tentar recuperar o valor do voto como verdadeiro instrumento de participação política: em vez de considerá-lo um direito fundamental, porque não transformá-lo em “habilitação”, igual à que precisamos tirar para poder dirigir.

Em linhas gerais funcionaria assim. Com 16 anos, um jovem estaria apto a se inscrever , gratuitamente, para adquirir a sua habilitação de eleitor. A partir de então, ele seria obrigado a fazer um “CFC da política”, um curso de uma semana que explicaria os princípios que regem uma democracia; o funcionamento dos partidos políticos; as leis; o parlamento e quais são os instrumentos de participação. Após o curso, o candidato deveria se inscrever para a “Prova Teórica” onde seu conhecimento básico a respeito do que foi ensinado previamente seria avaliado.

Caso aprovado, o futuro eleitor receberia uma “habilitação provisória”, obrigando-o a participar das duas eleições seguintes (depois o voto não seria mais obrigatório). Nessas duas primeiras experiências, o eleitor deveria participar de grupos de debate e aprofundamento, para entender mais a respeito das questões ligadas à atualidade política do país. Após esse período provisório, o jovem finalmente receberia a habilitação definitiva.

Em caso de uso indevido dos direitos políticos, como crimes ligado à corrupção, que deveriam ser estipulados pela Justiça, ele poderia ter a habilitação suspensa ou em casos graves, retirada. Após os 70 anos, o eleitor também passaria a ter seus direitos de eleitor limitados à esfera local ou regional, para que não aconteça casos como o do Brexit, em que uma grande parte da população idosa acabou determinando o futuro – indesejado – da juventude da Grã-Bretanha.

Tenho dúvidas se tudo isso faz sentido. Você acha que seria uma boa ideia? Daria certo no Brasil?
Eleições

Voto obrigatório: serve um instrumento se não se sabe usá-lo?

Voto obrigatório

Nunca achei que a obrigatoriedade do voto pudesse, de alguma maneira, dar legitimidade a uma democracia. Ter em mãos um importante instrumento da vida democrática, mas não saber usá-lo para o próprio bem (e para o bem comum), é como tomar remédio “tarja preta” sem prescrição médica. Nos dois casos os danos podem ser irreversíveis.

No advento de mais uma eleição e na evidente necessidade de uma reforma política, tenho pensado no valor que o voto obrigatório tem para a democracia brasileira. Na nação em que eu, agora, vivo, o Estado não obriga seus cidadãos a votarem. O problema da abstenção existe, mas isso não afeta o bem estar geral e nem diminui a qualidade da democracia do país.

Quando passou a ser obrigado votar?

Voto obrigatórioSegundo o excelente estudo feito pela Professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londrina, Luzia Helena Herrmann de Oliveira, “O voto obrigatório foi implantado no Brasil com o Código Eleitoral de 1932 e transformado em norma constitucional a partir de 1934. Regulamentado em um período de transformações institucionais que objetivavam dar credibilidade ao processo eleitoral, ele foi justificado como uma necessidade para garantir a presença dos eleitores nas eleições.

No período em que o voto foi determinado obrigatório, explica Luzia de Oliveira, o eleitorado “restringia-se a cerca de 10% da população adulta, o que significava um número muito reduzido (Soares, 1973). Contudo, com as transformações da sociedade brasileira e a concessão dos direitos políticos aos maiores de 16 anos e aos analfabetos, esse percentual cresceu expressivamente”. Nas eleições de 1998, por exemplo, tivemos a participação de 67% da população brasileira (TSE, 1998a; IBGE, 1998a).

Não basta poder votar

Hoje, como pudemos observar, o percentual de eleitores cresceu bastante. Dessa forma, acredito que se deva privilegiar não mais a quantidade de eleitores, mas a qualidade da participação. Não sou um especialista em política eleitoral e não quero fazer um tratado sobre o assunto, mas tendo a pensar que o voto, sem uma educação política, é um instrumento ineficaz, com valor exclusivamente simbólico.304561_333063526785406_586973567_n

Votar é a ponta do iceberg da participação política e não deve se limitar a escolha de representantes, mas englobar outros aspectos políticos, como a aprovação/rejeição direta de leis, por exemplo. Creio que o cidadão eleitor, ao enxergar a ressonância direta de suas escolhas nas decisões políticas, irá viver a democracia com mais constância. Cabe também ao governo estimular a participação política, criando mecanismos de informação e formação para que seus cidadãos, desde muito cedo, descubram as possibilidades de protagonismo, no interior do espaço político onde vivem.

A defesa do voto obrigatório

Muitos daqueles que defendem o voto obrigatório afirmam que não existe qualquer comprovação do argumento de que o voto obrigatório prejudica a qualidade da democracia. É verdade. Não é o voto em si que prejudica a nossa democracia, mas a ilusão de que a possibilidade de votar qualifica positivamente um ambiente democrático.

No Brasil, na prática, o eleitor pode justificar seu voto em qualquer seção eleitoral do país e se não fizer, recebe uma multa irrisória de R$ 3,50. Além disso, o eleitor pode escolher anular seu voto nas modernas urnas de nosso sistema.

“Nas últimas três eleições presidenciais, tivemos o comparecimento de quase 75% dos eleitores, uma marca invejável para qualquer democracia do planeta. A obrigatoriedade do voto também faz da eleição um momento especial de informação do eleitorado. De dois em dois anos, somos levados a nos atualizar acerca dos assuntos que dizem respeito a nossa vida coletiva e decidir por pessoas, ideias e projetos, em detrimento de outras pessoas, ideias e projetos. Em países onde o voto não é obrigatório, como nos Estados Unidos, esse processo é mais diluído, e boa parte dos cidadãos passa incólume pelo processo eleitoral. Não no Brasil. Nossas eleições são um evento cívico vivido por quase todos nós” explicam os João Feres Júnior, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Fábio Kerche, pesquisador da Fundação Casa de Rui Barbosa.

Contudo, da mesma forma que o comparecimento quantitativo não enriquece o contexto participativo em uma democracia, viver o período das eleições com a mesma emotividade que existe no contexto futebolístico, por exemplo, é extremamente pouco produtivo. Quanto mais nos aproximamos das eleições, mais vejo, sobretudo nas redes sociais, a reprodução indiscriminada de acusações e críticas pouco construtivas direcionadas a um ou outro candidato.

Com a obrigatoriedade do voto, o sistema eleitoral brasileiro promove uma justificativa falaciosa do que deveria ser a participação política. É fundamental informar-se e educar-se para entender que a democracia é um sistema vivo, dinâmico, de negociação de interesses, na diversidade e, principalmente, no respeito ao outro. Poder influenciar diretamente, não somente votando os representantes políticos, mas interferindo nas decisões ligadas ao município aonde se vive, é um instrumento que, acredito, valeria à pena ser experimentado.

Luzia Oliveira afirma que, “na Venezuela, análises realizadas anteriormente à reforma de 1993, indicavam a possibilidade de uma significativa queda na participação política, o que foi confirmado pelos fatos. Na Holanda, Irwin (1974) também observou mudanças nas atitudes dos eleitores após a implantação do voto facultativo em 1971”.

Mais participação é certamente garantia de uma democracia legítima e rica, mas não acredito que a mesma, delimitada há alguns cliques na urna eletrônica, pode ser considerada real e construtivas.

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[i] OLIVEIRA, Luzia Helena Herrmann de. Voto obrigatório e eqüidade um estudo de caso. São Paulo Perspec. [online]. 1999, vol.13, n.4 [cited  2014-08-11], pp. 144-152 . Available from: . ISSN 0102-8839.  http://dx.doi.org/10.1590/S0102-88391999000400016.

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