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Yara: Um rio de felicidade – Segundo ato

Chegamos na casa de parto de Berna para o nascimento da Yara sem saber ao certo se já estávamos no quase. A minha única certeza é que devia fazer o esforço para direcionar o foco do que sentia para o suporte e a presença que a Flavia precisava.

Costumo dizer que não existe nada mais mágico do que o momento da chegada de uma vida no mundo de cá.

Após sermos recebidos pelas sorridentes, e super jovens, parteiras, entramos em uma sala com luz baixa, aconchegante, mas logo o trabalho de parto evoluiu e nos dirigimos à banheira. A Flavia queria muito ter um parto na água, com a esperança de que ia ajudar a aliviar a dor.

O que experimentamos a partir do momento que entramos na sala de parto, com a banheira, naquele 12 de Setembro, foi bem diferente do que vivemos com a Tainá. As contrações vinham, mas a Yara não. O fato de não ter uma parteira experiente o bastante para guiar a Flavia nesse momento exigente, foi tirando a tranquilidade dela (e minha) e o parto foi se alongando.

Depois de diversas tentativas, fomos informados que a Yara estava virada, em uma posição que dificulta a “expulsão” (nome feio) do bebê. Mas a Flavia continuava lá. Percorrendo a maratona dela. E eu, procurando encorajar com sorrisos, palavras de incentivo e suco de frutas.

Lembro como se fosse ontem da palidez e a exaustão no volto da minha companheira. O medo e a apreensão. Ali, mais uma vez, via meu caráter controlador sendo provado. O que podia fazer era pouco, mas nada era desculpa para me desconectar daquele momento sagrado.

Puxa empurra, puxa empurra. 

E finalmente a nossa rainha do rio deslizou sobre as águas da banheira. 

Alívio? Ainda não, pois a Yara não estava respirando. 

A chegada da Tainá – Parte dois: Cumplicidade

“Você está de parabéns! Foi um parceiro muito participativo. Fiquei impressionada”, foram as palavras de Ruth, o nosso anjo da guarda durante o parto, para mim, acrescentando que normalmente os companheiros que têm filhos na casa de parto são bem participativos, mas raramente ajudam as esposas sem precisar de orientação da parteira.

Juro que o comentário da dona Ruth, parteira com mais de 20 anos de experiência em partos domiciliares na Inglaterra, não encheram o meu ego. O parto nada tem a ver com egos. É um milagre tão grande que essas miudezas humanas passam longe.

Se eu pudesse resumir em uma palavra as (só?) cinco horas entre o início das contrações regulares até o nascimento da Tainá eu diria: cumplicidade. Do encher a banheira para minha esposa relaxar, a fazer massagem nas costas (que eu prefiro muito mais receber). Do proferir palavras de incentivo, aos sorrisos e a lembrança de que logo conheceríamos a nossa amada filha.

Cumplicidade é a base de qualquer família. Não tenho dúvidas disso. Porém, seria um erro pensar que ela começa no parto, ou mesmo na gravidez. O cuidado mútuo, os sacrifícios pelo outro, a empatia e a paciência se desenvolvem na vida à dois muito antes. E esse exercício passa a fazer muito mais sentido em momentos fortes como o do nascimento de um filho. Nele, a capacidade de amar, incondicionalmente, é colocada no limite.

Bom… quando voltamos da casa da madrinha da Flavia tudo realmente ficou bem mais intenso. Preparamos a banheira, a Flavia tomou banho e tentou relaxar na água, mas não encontrar uma posição confortável parecia deixá-la mais agitada. Então decidimos ir para o nosso quarto. Com um aplicativo de celular eu ia monitorando a regularidade das contrações, tentando ficar atento às reações da minha esposa para entender o aumento da intensidade delas. Mas já depois de uma hora, a dor, somada a preocupação de se o bebê estava bem, nos fez ir para a casa de parto.

A Flavia ligou e as 23h lá estávamos para um controle. Tudo bem com a mãe e filha, mas o trabalho de parto só havia iniciado. Dois dedos de dilatação. Fomos orientados a voltar para casa para a Flavia descansar, porque a “maratona” até o nascimento poderia ainda durar mais de 12 horas. Então entramos no carro um pouco decepcionados em ter que ainda esperar pelo grande encontro.

E eu? O Pai. O que senti? Nada… na verdade não lembro muito bem. Foi tudo tão intenso e estava tão preocupado em estar lá, presente, para minhas queridas, que não tive tempo para refletir.

Às 24h chegamos na casa da minha sogra novamente. Fomos para o quarto e lá começou a etapa mais difícil de toda a experiência do parto. Dor, gritos, tensão, mas dentro felicidade. Gratidão. O tema do último texto.

A chegada da Tainá – Parte um: Preparação

Quando minha esposa gritou: “Hugo! Vem aqui! Rápido” e juntos percebemos que o tampão tinha caído, senti uma serenidade gostosa fruto da minha preparação e a alegria de que logo (mesmo não sabendo quão logo) conheceríamos a nossa filha.

Se tem algo que considero um valor e que procuro colocar em prática na minha vida, desde menino, é estar preparado. Estudo, carreira profissional, relacionamentos… em todos os aspectos e momentos da minha história sempre tentei fazer bem o que me cabe, acreditando que Alguém irá cuidar daquilo que não tenho controle.

Não vou esconder que, de certa forma, preparar-me sempre me proporcionou o controle das minhas emoções, diminuiu meu medo e criou o espaço necessário para viver plenamente cada momento.

Na tarde que antecedeu aquele grito, estávamos caminhando em Zurique, passeando para aproveitar o dia bonito e a presença da minha mãe, que veio para viver junto com a gente essa nova experiência. Foi um dia gostoso e tranquilo. À noite, fomos visitar a família da madrinha da Flavia que logo ao ver o barrigão disse que ela ainda deveria esperar alguns dias pois a barriga ainda estava “alta”. Passamos uma noite super agradável até que aquele “Hugo! Vem Aqui!”, acelerou o coração dos presentes.

É realmente reconfortante sentir-se preparado. Aqui na Suíça frequentamos um curso para “grávidos” que nos fez percorrer, junto com outros três casais, a jornada do nascimento e dos primeiros cuidados. Foram horas repletas de informações úteis e descobertas extraordinárias, ao menos para mim que sou o pai.

Li quatro livros sobre paternidade, parto, gravidez para entender bem os sentimentos da minha esposa, os meus e da nossa filha. Assistimos também o documentário “O Renascimento do Parto”, que me ajudou a desmistificar os perigos do parto natural, que é o mais comum na Europa (mesmo se descobri que a Suíça é o país campeão de cesarianas do continente).

Lá da casa da madrinha da minha esposa ligamos para a casa de parto e eles recomendaram que voltássemos para casa da minha sogra o quanto antes para relaxar e ver como as coisas se desenvolveriam.

Eram umas 21:00. As próximas horas seriam bem mais intensas do que eu poderia imaginar. E assim outro valor passou a ser fundamental: a cumplicidade.

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