minorias mudas

É fato: quando a mídia trata, principalmente, de acontecimentos no continente africano ou no Oriente Médio, temos uma leitura unidimensional que produz aquelas que considero minorias mudas. Calma. Vou tentar explicar abaixo.

Graças ao aprendizado da língua, agora tenho o privilégio de poder acompanhar as leituras midiáticas também em francês. Em uma delas a vice presidente da União Francesa dos Judeus pela Paz, Michèle Sibony, evidencia a produção de um discurso unilateral pela imprensa Europeia que acaba legitimando os ataques israelenses direcionados à Gaza.

A “Guerra Santa” que o “Ocidente pós 11 de setembro” tem traçado contra o islamismo coloca as diferenças religiosas como principal promotor de um conflito extremamente complexo, como é aquele entre Israel e Palestina. A necessidade maniqueísta de identificar aqueles que são, segundo o Ocidente, os “bons” – o “povo judeu” –  e os “maus” – os terroristas do Hamas –  em vez de promover um aprofundamento das verdadeiras questões, reduz as possibilidades de um real entendimento e uma plausível negociação.

Segundo Michèle Sibony, no que diz respeito ao conflito Israel-Palestina, a mídia ignora as vozes da minoria e, dessa forma, “rouba” a sua capacidade de apresentar e defender suas causas em uma situação de paridade. Eu diria que elas, assim, permanecem minorias mudas.

Dar forma aos fatos

minorias mudas

Na minha tese de “laurea magistrale” fiz um mergulho (não tão profundo, porém decidido) na comunicação como dimensão ontológica da pessoa humana. Por ser parte do nosso “ser no mundo” a comunicação também subsiste nos instrumentos que forjamos para exprimir nossa existência. Queremos comunicar com nós mesmos, com os outros e com o Transcendente, esta última, uma dimensão ignorada, quase subjugada, mas que precisa urgentemente ser redescoberta.

A partir deste estudo inicial, que me fez entender qual seria a “alma” da comunicação, passei a aplicar essa visão tridimensional do “comunicar” às diferentes análises e percepções que fiz a respeito da mídia de massa, visando entender melhor como ela se comporta ao traduzir sua leitura dos acontecimentos (ou fatos) em informação.

Informar é, acima de tudo, dar forma. Nada de novo, claro. Sobretudo no que diz respeito ao significado semântico do termo. Contudo, as “formas” que são dadas aos fatos do cotidiano, nem sempre espelham a sua universalidade.

Como, geralmente, são sempre as mesmas pessoas, as mesmas empresas de comunicação, dos mesmos países que “informam” o mundo, acabam  sendo sempre promovidas as mesmas visões, que evidenciam interesses específicos.

Dar voz as minorias mudas

“O simétrico da comunicação, na ordem dos valores, é o respeito ao outro e a confiança. Comunicar com o outro é reconhecê-lo como sujeito, portanto, estar mais ou menos obrigado a ter-lhe alguma estima”, explica Dominique Wolton e acrescenta “a comunicação obriga ao mesmo tempo à argumentação e a tolerância. (…) O essencial é esta demanda de compreensão de si e da melhora das relações com o outro.”

Simetria. Respeito ao outro. Confiança. Reconhecimento. Estima. Tolerância. Todos termos que exprimem a intrínseca relação existente entre comunicar e “o outro”.  Em uma sociedade como a nossa, em que o poder da palavra e da imagem é decisivo, quando o jornalismo perde essa capacidade relacional, multidimensional, ecoa aquele que eu chamo de “Fundamentalismo da palavra”, em que a opressão ideológica se baseia no dar voz exclusiva a um ponto de vista e silenciar “o outro”.

Para Wolton “confiança e respeito são as palavras chaves da sociedade de comunicação”. Não se pode jamais silenciar as minorias, os mais fracos. É esse o grande motor dos holocaustos.

Neste caso o jornalismo precisa ser responsabilizado. Especialmente quando, em vez de buscar a Verdade, fundada na relação entre as diferentes vozes, ele se torna uma espécie de assessoria de imprensa das ideologias de governos e governantes aproveitadores.

O desafio é grande!