Holocausto Brasileiro

A loucura nunca foi um assunto corrente na minha vida. Sempre considerei complicado, em um mundo tão multidimensional, encontrar um padrão único de comportamento que seja admitido como “normal”.  Em um certo sentido somos todos loucos, pois, para sobreviver às rápidas mudanças sociais e culturais é preciso desenvolver uma capacidade de transcender constantemente as normas do “status quo”.

Por outro lado, nunca havia pensado que, no Brasil (e talvez em todo o mundo), o tratamento dos seres humanos considerados “socialmente incompatíveis” teria uma história tão trágica ao ponto de ser nominada “holocausto”.

Holocausto brasileiro: um crime coletivo

Holocausto Brasileiro

Foi só me debruçar nas primeiras páginas do livro da colega jornalista, Daniela Arbex, que rapidamente pude perceber, que a história que estava sendo contada, era um drama sem precedentes, desconhecido pela maioria dos brasileiros.

O livro-reportagem conta a barbárie e a desumanidade praticadas, durante a maior parte do século XX, no maior hospício do Brasil, conhecido por Colônia, situado na cidade mineira de Barbacena.

As palavras de Daniela denunciam um genocídio cometido, sistematicamente, pelo Estado brasileiro, com a conivência de médicos, funcionários e também da população, que ativa ou passivamente contribuíram para uma das maiores violações dos direitos humanos que se tem registro na história do Brasil.

Os números desse massacre são assustadores: pelo menos 60 mil pessoas morreram entre os muros da Colônia. Em sua maioria, internadas à força, sem diagnóstico de doença mental. Eram epiléticos, alcoólatras, homossexuais, prostitutas, meninas grávidas violentadas por seus patrões, esposas confinadas para que o marido pudesse morar com a amante, filhas de fazendeiros que perderam a virgindade antes do casamento. Enfim, gente que se tornara incômoda para alguém com mais poder.

Somos todos loucos. Fato!

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Lendo as páginas do Holocausto Brasileiro, não tive dúvidas de quem eram os verdadeiros personagens privados de juízo moral: agentes de saúde, políticos, familiares e outros cidadãos comuns que, visando a resolução de uma situação constrangedora, escolheram como saída a desumanização de seus iguais.

Não acredito que lidar com os problemas sociais seja algo fácil. Mas, sem dúvidas, a integridade do ser humano precisa nortear as estratégias de resolução.

Nós, como sociedade, não podemos jamais optar pelo silêncio diante de qualquer violação dos direitos humanos, sejam elas nas prisões, nos centros de sócio educação para adolescentes ou nas favelas â mercê do tráfico de drogas. Claro que, para isso, devemos conhecer esses direitos.

“O descaso diante da realidade nos transforma em prisioneiros dela. Ao ignorá-la, nos tornamos cúmplices dos crimes que se repetem diariamente diante dos nossos olhos. Enquanto o silêncio acobertar a indiferença, a sociedade continuará avançando em direção ao passado de barbárie. É tempo de escrever uma nova história e de mudar o final”.

É forte, mas verdadeiro: “a história do Colônia é a nossa história. Ela representa a vergonha da omissão coletiva que faz mais e mais vítimas no Brasil”.