amor e gentileza

“Com os olhos toldados e incrédulos, não vemos, com muita frequência, que cada um e todos foram criados como um dom para nós e nós como um dom para os outros. Mas assim é. E um misterioso vínculo de amor liga homens e coisas, conduz a história (…)”. Chiara Lubich

Voltando do trabalho, dia cansativo, ônibus lotado, pessoas que se esbarram umas nas outras pela falta de espaço, uma hora e meia em pé… Em minha frente observo um homem ficando vermelho e em seguida arroxeando-se, percebo que não está passando bem. Sem pensar ofereço-lhe a minha garrafinha de água. E fico ali ao seu lado, sem dizer nada. Quando voltou a sentir-se melhor agradeceu-me muito e disse ‘você salvou minha vida’. Palavras fortes para um gesto tão simples. Depois daquele dia sempre que ele me encontra no ônibus me cumprimenta, ainda com um sorriso de gratidão.

Saindo de uma Igreja no centro da cidade de São Paulo, fim de tarde, vontade de chegar logo em casa. Na porta encontro uma mulher chorando. Observo e passo rapidamente por ela. Após alguns passos, algo me impulsiona a voltar. Aproximo-me dela, a olho, pergunto como está, se posso ajudar de algum modo. Entre lágrimas me conta sua dor daquele momento: havia sido demitida. Pergunto se posso dar-lhe um abraço e digo que a recordaria em minhas orações. Suas lágrimas cessam um pouco, me olha e um sorriso tímido lhe ilumina a face e diz: “estava aqui desacreditada do mundo e das pessoas, mas encontrar pessoas como você me faz ainda ter esperança”. Nunca mais nos encontramos, mas algo naquele momento nos uniu. Por semanas lembrei-me de rezar por ela.

Em uma noite chuvosa, saí de casa já atrasada para um compromisso. No caminho avisto uma senhora caminhando sob a chuva com uma criança. Dentro de mim, penso: “poxa, coitadas! Queria fazer algo, mas estou atrasada”. E logo em seguida: “mas o que importa?” Faço o retorno com o carro e ofereço a elas carona. Sem pensar entram em meu carro e rapidamente chegamos até a casa delas. Antes de descerem pergunto o nome da criança, Tamires. Ao me agradecer a senhora exclama: “Você foi um anjo que nos apareceu!”

Pequenas gentilizas com um grande significadoFlorGentil1

Alguém poderia questionar, mas a que servem essas gentilezas? São suficientes para realizar uma transformação social? Com certeza seria necessário muito mais! Talvez eu precisaria conhecer aquele homem no ônibus, encontrar um trabalho para aquela jovem, visitar Tamires e sua avó…

No entanto, os simples gestos do dia a dia, que poderiam ser relatados por tantas pessoas, parecem-me revelar a incrível possibilidade de comunicar-se com outros seres humanos, aparentemente distantes que, de maneira improvisa, tornam-se próximos, e provocam em nós um movimento de saída da esfera do egoísmo e das próprias necessidades, para estar atento àqueles que nos circundam.

Caminhando juntos rumo a verdadeira transformação

20111113114608508303aA alegria pessoal experimentada realizando pequenas gentilezas é enorme, preenche o dia de um sentido, difícil de ser vivenciado de outro modo, senão àquele da doação de nós mesmos. Ser presença gentil e solidária, paciente e respeitosa, sinal do amor que pode transformar nosso cotidiano. Entretanto, a mudança só pode ser realizada por pessoas em ação. Muitos homens e mulheres que, sendo capazes de irem além de si mesmos, encontram o espaço onde se sentem unidos. É justamente nele que uma verdadeira transformação pode ser desencadeada!

Não é bonito pensar que também, na correria do dia a dia, ao caminharmos pelas ruas das nossas cidades, podemos construir momentos de fraternidade?

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 Acessibilidade e inclusão social: preocupação real ou moda? | Karina GonçalvesKarina Gonçalves da Silva Sobral – Formada em Terapia Ocupacional pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) em 2007, motivada por questões existenciais e busca de respostas em como lidar com o sofrimento do outro, dos tantos outros que já tinha encontrado nas recentes mas, intensas, práticas como terapeuta ocupacional, concluiu em 2011 a “laurea magistrale” em ciências políticas no Instituto Universitário Sophia, na Itália.  Possui experiências, principalmente, no Serviço Público, na área de saúde mental,  e, atualmente, é terapeuta ocupacional com atuação na educação especial.