Tamerlan Tsarnaev recebe troféu em universidade do Massachusetts, em 2007 Julia Malakie / AP

Tamerlan Tsarnaev recebe troféu em universidade do Massachusetts, em 2007 Julia Malakie / AP

Depois do triste acontecimento em Boston onde, supostamente, dois jovens de origem chechena armaram duas bombas durante a maratona da cidade, parece que o mesmo ódio que impulsionou o ato terrorista, ainda vive entre os cidadãos afetados pelo episódio dramático.

Passado quase um mês do terrível ataque, algumas cidades do estado de Massachusetts (nordeste dos EUA) se recusam a enterrar o corpo de um dos acusados, Tamerlan Tsarnaev, de 26 anos. Esse comportamento adotado por alguns cidadãos americanos evidencia alguns aspectos importantes e ilustra tamanha capacidade de desumanização, ao ponto de suscitar o desejo de vingança até mesmo de um corpo inerte.

O homo sapiens é o único animal que enterra seus iguais. O enterro é sinal antropológico dessa humanização. Até mesmo em conflitos bélicos enterram-se os inimigos como, talvez, uma maneira de encerrar a disputa. Negar-se enterrar o corpo de Tsarnaev é também uma demonstração de ignorância, de ódio cruel, mas é, sobretudo, um comportamento que dá continuidade a um acontecimento triste, que já devia ter sido enterrado.

Além dos aspectos mencionados, existe outro, mais sério. Não é a primeira vez que um crime dessas proporções surge internamente nos Estados Unidos. O massacre de Columbine, em abril de 1999, no estado do Colorado, Estados Unidos, é talvez o caso mais chocante. Na ocasião, os estudantes Eric Harris, de 18 anos, e Dylan Klebold, de 17, adolescentes típicos de um subúrbio americano de classe média alta, atiraram em vários colegas e professores do Instituto Columbine, matando 13 deles.

Ambos eram americanos. Não existia aqui a “desculpa” de serem de origem chechena, árabe, norte coreana, iraniana e assim, mesmo tendo cometido um crime horrendo, os jovens tiveram seus corpos sepultados no país. A renúncia do sepultamento do corpo de Tamerlan Tsarnaev, que vivia há mais de 10 anos nos Estados Unidos e tinha visto permanente é também uma omissão, como sociedade, da própria parcela de culpa neste acontecimento triste.

Um ato terrorista é, sobretudo, um ataque institucional, movido pelo ódio ou ideologias políticas que, ao meu ver, podem ser superados com a igualdade de direitos, a tolerância, o respeito e a consciência de que, independente de onde estamos, somos parte do corpo social. Algo faltou aos jovens de origem chechena que, claro, não torna menos injustificável o ato terrorista, mas que deve servir de alerta à sociedade, como um todo, de que o ódio fundamentalista precisa ser combatido com a fraternidade.