Sobre a Felicidade… e por isso esperamos do outro

 Durante muito tempo eu procurei encontrar o significado do amor presente na expressão “Anular a si mesmo por amor ao Outro[1]”, que meu percurso espiritual constantemente propunha. Contudo, sem uma explicação metodológica, sentia que “encarnar” essa frase me fazia arriscar uma “aceitação ideológica” motivada por conclusões exclusivamente sentimentais.

Tendência a possuir

Nos relacionamentos[2] que construí me deparei com a tendência, para me sentir seguro, de querer transformar o “Outro” que está ao meu lado em um “outro” que construí psicologicamente.

Contudo, descobri com o passar do tempo que, por ser verdadeiramente Outro, um ser humano é necessariamente causa de realização, mas também de dor para quem está próximo.

Todos nós somos levados a experimentar com as nossas vidas não só o protagonismo que constrói um “novo mundo”, mas também a fatiga de carregar as escolhas – positivas e negativas – das gerações precedentes. Assim, cada um é um universo em si, feito de caminhos, escolhas e constituições psicossociais e fisiológicas completamente diferentes. Cada um é um Outro abissal, impossível de determinar.

Desta forma, a escolha fundamental de “não pretender”, contrária a tendência de possuir o Outro concerne não só o confronto interior baseado nas escolhas de hoje, mas também o enfrentamento das escolhas de bem e mal que herdamos como ser humanos e por isso (a meu ver) tão difíceis.

Aceitar o Outro

Por outro lado, aceitar o Outro no seu ser essencialmente diferente ajuda a perceber que não é se apossando de alguém que nos realizamos. Sem a gratuidade não existe amor, não existe dom verdadeiro de si mesmo.

O outro que construímos psicologicamente será sempre finalizado a nós mesmo, limitado e não poderá se exprimir em todas as suas infinitas e surpreendentes dimensões. O verdadeiro Outro, é muitas vezes causa de dor, mas é capaz de nos fazer experimentar um amor irredutível, infinito.

Entender tudo isso me ajudou a perceber que eu, como amante, preciso impulsionar sempre mais os Outros a serem cada vez mais eles mesmos, consciente de que isso possa me machucar, porque foge do meu controle, da posse.

Essa escolha metodológica me permite experimentar a certeza de que, quanto mais o Outro é si mesmo, mas ele descobre os caminhos para a própria felicidade e (tantas vezes) que eu também sou uma importante parte dela.

É preciso ter coragem para anular a si mesmo e acreditar que indo pelo próprio caminho o Outro, finalmente, porque sente a força do meu amor, me reencontra. Essa força nasce de uma dimensão antropológica que se traduz no Mistério Sobrenatural, mas que procurarei explicar em outro momento.


[1] O “Outro”, escrito com letra maiúscula é o outro essencialmente diferente de mim nas suas três dimensões relacionais: relacionamento com si mesmo, com os outros e com o mistério. Um outro impossível de possuir.

[2] Sendo eles exclusivos (namoro) ou  amizades e relações na família.

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1 Comment

  1. Anonymous

    Beissimo! Tudo bem com você!? Meu filósofo “Spark”!

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